Reviravolta
Já escrevi e reescrevi este post. Não me tem saído bem.
Falei com os chefes e entreguei a carta de demissão aos RH. Não dei hipótese de negociar seja o que for. Queria sair e ponto final. Não queria permitir que me criassem um dilema, com uma contraproposta que me fizesse tremer. A decisão era minha, unicamente minha. Passou uma semana e sentia-me bem e tranquila até que o chefe chama-me e diz-me "Inês duplico o seu salário e dou-lhe outras funções. Fica?". Este era o momento que eu temia e evitara a todo o custo. Aliás, nunca imaginei o momento assim. Sabia que havia a possibilidade de igualarem o salário que eu tinha fora da empresa mas nunca imaginei que ultrapassassem esse valor. Duplicar o salário é uma diferença absurda. Por um lado, é ótimo. Por outro, revela de forma clara e inquivoca como fui mal paga durante três anos sem justificação. Revela e prova ainda, de forma aparentemente injusta, como o sistema funciona. Trabalhei três anos e nunca pedi aumento. Apenas uma vez numa avaliação de desempenho. Fui aumentada 35€ e ouvi que tinha que os aumentos tinham que ser devagar que eu ainda era nova e tinha muito que aprender. Oito meses depois eu tomo a decisão de sair, comunico-a com a calma mas com assertividade e de uma semana para a outra deixo de ser nova demais para ganhar bem. E nem sequer pedi nada. Se pedisse, quanto mais poderia haver? O dinheiro existe e quem não chora não mama. Causa quase um sentimento de injustiça por durante tanto tempo ter ganho tão pouco. Porém, como havia dito nuns posts anteriores, ter reunido a coragem de sair e avançar com essa decisão foi o despolotar do melhor de dois mundos. Se saísse, saía bem cheia de sede por descobrir novos mundos. Se ficasse, que era muito improvável no início, só ficaria por razões muito fortes. Neste caso, não pude ignorar a duplicação da valorização do meu tempo, o facto de ser um emprego seguro, de ser um sítio onde me sinto bem, tenho boas condições, tenho colegas e amigos com quem passo o dia a rir, tenho autonomia, responsabilidade e conhecimento acumulado que me possibilitam crescer internamente (apesar de já saber que nunca crescerei muito, a verdade é que num universo de 70 pessoas, estou numa das escassas posições onde posso efetivamente evoluir). Além disso, é uma empresa com história que efetivamente tem estabilidade financeira e, apesar de dividir de forma injusta essa rentabilidade, eu tive a sorte de, nesta situação, estar do lado dos afurtunados. Sendo uma pessoa que na generalidade considera que lhe faltou sorte em alguns aspetos da vida e que anda sempre à procura de melhor, não posso ignorar esta grande sorte. Tive sorte e azar em ter esta empresa como primeira casa profissional. I mean, poderia ser sempre pior. Poderia ser sempre melhor. Tenho nos meus pares mais próximos, exemplos de ambos os lados. Pessoas que saíram da univ e andaram a saltar de empresa em empresa por diversas razões. Pessoas que entraram, foram logo bem pagas e não saíram. Pessoas que entraram, foram bem pagas e querem sair de qualquer forma. Pessoas que continuam a ser mal pagas mas estão bem. Pessoas que andaram meses e meses à procura de emprego e finalmente encontraram. Há uma diversidade de caminhos a percorrer. Apesar de a comparação ser inevitável e, no meu caso, ter sido a origem da desilusão para com a minha empresa, foi também o motor para querer chegar a um sítio melhor e essa motivação levou-me a melhorar as minhas condições num sítio onde já estava. As condições já existiam, simplesmente não estavam ainda ao meu alcance. Se é justo ou injusto? Quase nem interessa. É assim que funciona e temos que nos adaptar. Posso olhar para esta situação de diversas formas e, se saísse, encontraria uma série de boas razões para suportar essa decisão também.
O mais difícil foi, sem margem de dúvida, ligar para a empresa e recuar quando já tinha dito que iria trabalhar com eles. A verdade é que o mercado de trabalho é uma selva e sinto que fiquei numa posição ingrata. Sem dúvida que eles me pressionaram a dar uma resposta rápida e mesmo perante o meu discurso neutro do género "a vossa proposta agrada-me, vou falar com a minha administração e volto a contactar-vos" a resposta do outro lado foi literalmente "ficamos contentes, bem vinda à equipa". Depois de comunicar que entreguei finalmente a carta e de enviar os dados para o contrato, ligar para dizer que afinal já não iria concretizar a mudança custou-me muito. Quebrei a minha palavra e isso custa engolir. Mas teve que ser.
Há que tomar decisões. E eu tomei as minhas. Olho para trás e, neste momento, penso que no fundo tudo está bem. Tinha tomado a decisão de em 2020 mudar de emprego para melhorar a minha posição profissional. Não mudei de emprego mas a segunda parte cumpriu-se. Sinto que, de facto, ter a coragem de mudar é meio caminho andado para que coisas boas aconteçam.