Estado d'Arte
O ano começou com uma sensação estranha.
No dia 31 liguei ao DC para lhe dar os parabéns pois era o seu aniversário. Conversamos para lá de uma hora (também já não falávamos há muito tempo e acumularam-se muitas coisas para partilhar). A conversa foi normal, destacando-se apenas o facto de nesse preciso momento o DC estar a passar uns dias sozinho em viagem para "refletir". Bem, só isto já faz soar alguns alarmes. Ele não é o tipo de pessoa que viaje sozinho e também não costumava refletir muito (mas já lá vão esses tempos). Na última vez que estivemos juntos, foi notório que lhe custava o estado da nossa "relação". Percebi isso e gostaria que fosse diferente, que estivéssemos mais sintonizados. E sei que talvez fosse minha parte fazer o corte total pois tenho consciência do desiquilibrio emocional investido por cada um e talvez não fosse justo para ele dar continuidade ao contacto quando sei que ele quer mais e eu quero menos. Custou mas eu fui sendo honesta e por isso estávamos mais afastados nestes últimos meses. Depois do verão e depois de lhe custar muito também colocar a questão em cima da mesa, eu disse-lhe que não iria haver nada mais do que tínhamos e que não era meu interesse voltar a estar numa relação. Não ia acontecer, não havia mais espaço na minha vida para ele. Pode ser cruel mas é a pura verdade. E ele afastou-se. Conversamos de longe a longe só a ver se continuamos vivos. Mas no dia um de janeiro ele diz-me com todas as letras que quer-se afastar de mim pelo menos durante dois ou três meses pois tem que ultrapassar e manter o contacto comigo não ajuda. Entendo claro. Impôs os seus limites, tomou a decisão, comunicou-a. E bloqueou-me nas redes que é algo que nunca tinha acontecido. O sinal foi claro.
Não tenho como fugir. Eu fui a má da fita nesta peça. Arrastei (literalmente porque já não havia forças nem para andar) uma relação apenas à espera que o interesse voltasse. Teria sido tão fácil se o interesse voltasse. Teria uma relação bonita, podia avançar com a vida, talvez ir viver junto como os outros da nossa idade. Daqui a uns anos teríamos filhos. A parte amorosa da vida ficaria resolvida. À semelhança do que vi esta semana num dos episódios de Emily in Paris, a Emily tinha a vida planeada em Chicago, pouca coisa para prever, as linhas gerais da vida estavam traçadas e depois ela baza, conhece outro ambiente e tudo muda. De certa forma, identifico-me com essa parte de ter tudo planeado e à minha mão e de simplesmente isso não me atrair e deitar tudo fora só porque não é interessante o suficiente. E não sou pessoa de me ficar. Mas não sou mesmo. Sou uma pessoa de desalinho, de desarrumação, de algum caos. Vê-se isso na minha secretária do escritório, no meu carro, no meu quarto, nas minhas fotos, nos meus estudos, nas minhas relações. Sou eu. Foi assim que me tornei. Também esta semana ouvi dois episódios do podcast Voz de Cama com a Tânia Graça e a Ana Markl e ouvi-os precisamente pelos temas: ainda há amores para sempre? e não consigo ter uma relação longa. Enfim, muito do que ouvi já tinha ouvido pelas próprias mas dizia a Tânia que às vezes as pessoas crescem juntas numa relação até um certo ponto em que essa relação deixa de fazer sentido para uma ou para as duas. Não há motivos muito fortes além de simplesmente tornarmo-nos pessoas diferentes, que querem coisas diferentes e que têm coisas diferentes para oferecer. Gostei de ouvir isto porque penso que foi o que se passou connosco também. Tornei-me diferente, numa pessoa que gosta muito pouco de passeios e fins-de-semana românticos, que passou a detestar festividades, que adora estar e andar sozinha, cuja prioridade de tornou a mãe, a gata e o trabalho. E cujos ideais de relação mudaram e ainda estão num work in progress. E que acima de saber aquilo que quer para a vida, sabe aquilo que não quer.
Eu poderia ser como todos os outros (e talvez ainda me torne porque não ser dá medo) mas neste momento não me imagino mesmo. Tenho dificuldade em partilhar-me com alguém. Tornei-me muito minha. Emocionalmente. Adoro a independência. E até penso que basta me aparecer uma pessoa interessante e diferente no meu caminho que cedo a minha independência e vou. Penso nisso (e até é um medo que tenho) mas a realidade é que passaram dois anos e ninguém apareceu (estou a tirar o Lid da equação porque essa é uma carta fora de baralho). Fala-se na juventude que é só pessoas e relações cada vez mais curtas mas isso não me acontece. Eu ando aí, sou simpática e sorridente, falo com quem me rodeia mas em dois anos ninguém se aproximou. E já tenho 25 anos. Eu sei, são só 25 anos mas as hipóteses ficam cada vez mais limitadas. Mas Inês, tu és e queres-te manter uma pessoa sola! Jeez, a incoêrencia! Eu sou isto.
E por isso magoei o DC nestes últimos meses mais do que nunca. Sei disso e a imposição do corte de contacto deixou-me um bocado com uma sensação. Não gosto de cortes, por isso apenas o fiz uma vez com ele em 2019 e custou-me muito mas foi a melhor decisão que tomei. Mas não gosto de ter que rotular coisas, e agora somos isto, e depois aquilo, e então se não queres ser isto não podemos ser nada. Que chatos! Mas entendo, cada um tem as suas necessidades e cabe a cada um fazer acontecer. Mas os cortes deixam-me triste. Sempre me deixaram. Na verdade, e por causa disto, até encontro alguma beleza no ghosting. Há uns tempos fiquei muito chateada com o ghosting do Lid mas entendo-o perfeitamente. Preferimos deixar portas entreabertas em vez de fechá-las.
Mas eu e tu não somos pessoas iguais e começaste a ano a dizer-me Adeus na conversa de whatspp, achei excessivo e disse-te apenas bom domingo com smiles. Tu mantiveste o adeus como apropriado pois era o funeral da conversa. Não acredito que nunca mais fale contigo. Espero mesmo que conheças alguém que te faça feliz. Custa-me imaginar porque sempre te vi comigo mas espero mesmo que aconteça. Quero-te bem.